por Kennyo Ismail | maio 20, 2024 | Conceitos
Mulheres na Maçonaria não são um tema novo. Há registros históricos de mulheres como maçons operativas, bem como menções a estas no Poema Regius[1] (Séc. XIV) e no Manuscrito de York N.4[2] (Séc. XVII). Assim, somente a partir da Constituição de Anderson (1723),[3] o veto a mulheres passa a existir, mas não em absoluto.
Ainda no Séc. XVIII, surgiu o Rito de Adoção e as Lojas de Adoção, específicas para mulheres, a partir do Grande Oriente de França. E entre os Séculos XVIII e XIX, tem-se casos de mulheres iniciadas em lojas convencionais, como Elizabeth Aldworth, iniciada na Irlanda; Helene Hadik-Barkóczy, na Hungria; Marie-Henriette Heiniken e Maria Deraismes, na França; Julia Apraxin, na Espanha; Salome Anderson, na Califórnia; Catherine Babington, na Carolina do Norte, dentre outras.[4]
Entre o final do Séc. XIX e início do XX, começam a surgir as potências maçônicas mistas (com homens e mulheres), a partir da Ordem Internacional “Le Droit Humain” (1893); e as femininas, como a atualmente chamada “Ordem das Mulheres Maçons” (1908), que, apesar de ter sido criada mista, logo restringiu-se a mulheres.
No Brasil, o GOB fundou quatro lojas femininas, entre 1901 e 1902, que não emplacaram. E, em 1963, o então Grão-Mestre Geral, Álvaro Palmeira, tentou instalar o Rito de Adoção no âmbito do GOB, tendo sido vetado pela Soberana Assembleia Federal Legislativa daquela potência.[5]
Já no final do Séc. XX, a Grande Loja Unida da Inglaterra – GLUI e outras passaram a reconhecer a regularidade de prática da Maçonaria Feminina, permitindo que estas lojas utilizem seus templos, rituais e paramentos. Em seu site, a GLUI, declara ter “uma excelente relação de trabalho”[6] com a Maçonaria Feminina.
Hoje, a Maçonaria Feminina trabalha em estreita relação (sem intervisitação) com a Masculina em diversos países e não há forma de ser contra isso sem que seja por preconceito. Isso por uma simples regra: se você é contra algo que não prejudica você nem ninguém, isso é preconceito. E enquanto a Maçonaria Mista oferece algum tipo de prejuízo à convencional, pelo caráter concorrencial, apoiar a Maçonaria Feminina somente oferece benefícios. Dentre eles, pode-se citar: atendimento a uma demanda social, proteção contra possíveis processos futuros por discriminação de gênero, mais renda às lojas proprietárias de templos maçônicos com dias ociosos, e a certeza de que nunca se sentará em loja com sua sogra.
[1] BLUMENTHAL, M. (Org.) Antigos textos maçônicos e rosacruzes. São Paulo: Isis, 2006.
[2] HUGHAN, W. J. The Old Charges of British Freemasons. London: Simpkin, Marshall&Co, 1872.
[3] ANDERSON, J. A Constituição de Anderson. Trad. Kennyo Ismail. Brasília: No Esquadro, 2023.
[4] COIL, H. W.; BROWN, W. M. Coil’s Masonic Encyclopedia. New York: Macoy, 1961, p. 15.
[5] ISMAIL, K. Maçonaria brasileira: a história ocultada. Vol. I. Brasília: No Esquadro, 2021.
[6] Disponível em: https://www.ugle.org.uk/become-freemason/women-freemasons
por Kennyo Ismail | abr 18, 2023 | Crítica literária
Não há forma melhor de comemorar o tricentenário de uma obra literária que moldou nossa Sublime Ordem do que com uma edição comemorativa! Foi isso que a nossa editora No Esquadro fez, publicando uma edição muito especial da Constituição de Anderson (1723), traduzida e comentada por Kennyo Ismail.
A edição adotou fontes, diagramação e aparência similares à original; além de possuir capa dura com efeito envelhecido e miolo em papel amarelado pólen soft, de modo que o leitor possa ter a experiência de ler um livro de 300 anos!
A publicação da 1ª edição da Constituição de Anderson, em 1723, foi um importante marco histórico para a Maçonaria, pois inaugurou a Maçonaria como a conhecemos, por meio da promulgação desta que foi uma autoafirmação de um povo maçônico sobre seu direito de livre associação e seu desejo de estabelecer uma estrutura e um funcionamento mais permanente e iluminista para a Maçonaria, como se tem até os dias de hoje.
Pelo seu pioneirismo, conforme a própria Maçonaria florescia em novos territórios, a Constituição de Anderson também servia de primeira referência literária. Não por acaso, ela foi a primeira obra maçônica impressa nos EUA, por ninguém menos que Benjamin Franklin.
A obra, que foi publicada graças a financiamento coletivo, já está disponível. Você pode adquirir o livro impresso CLICANDO AQUI e o ebook NESTE LINK.
por Kennyo Ismail | set 15, 2016 | Notícias
Há anos que eu tenho dito isso em minhas palestras e me deparado com o espanto no olhar da maioria dos irmãos na plateia, seguido de um franzir de testa por boa parte desses.
Como bons papagaios de avental, repetimos sempre que possível que a Grande Loja de Londres e Westminster foi fundada em 24 de junho 1717, tendo Anthony Sayer como seu primeiro Grão-Mestre, e, portanto, a Maçonaria Especulativa existe desde 1717 e blá-blá-blá, tomando por ponto de partida, sempre, 1717, quase que como um número cabalístico.
Sempre questionei tal informação. Sempre questionei o fato de não haver um documento com registro público da época, ou mesmo uma notícia reproduzida em um dos jornais londrinos. Sim, Londres tem jornais circulando desde 1621. Como poderiam deixar de noticiar algo como isso? A chamada Carta de Bolonha, quase 500 anos mais antiga, foi registrada em cartório… por que uma ata de fundação de 24/06/1717 não seria?
Mas a resposta dos irmãos a esse questionamento quase sempre foi mais ou menos a seguinte: “Todo mundo sabe que foi em 1717. Por que diabos você está questionando isso?”. E isso acompanhado de um nariz torcido.
Além disso, as notícias dos preparativos para a comemoração dos 300 anos da agora Grande Loja Unida da Inglaterra, por si, vinham dando ainda mais como certa essa “crença popular maçônica”. Pelo menos até agora…
Uma recente Conferência sobre História da Maçonaria, realizada pela afamada Loja de Pesquisas “Quatuor Coronati”, com o apoio do Queen’s College da Universidade de Cambridge, acaba de escrever um novo capítulo quanto a esse embuste sobre a fundação da então Grande Loja de Londres.
O famoso pesquisador maçônico, Dr. Andrew Prescott, e a professora de história e pesquisadora, Dra. Susan Mitchell Sommers, apresentaram na conferência um documento recentemente descoberto em um antigo livro de atas da “Lodge of Antiquity” (uma das fundadoras da Grande Loja de Londres e da qual William Preston foi Venerável Mestre), revelado recentemente. Trata-se da ata de fundação da Grande Loja, em 1721, tendo como seu Grão-Mestre fundador John Montagu, o 2º Duque de Montagu.
Esse documento histórico não somente impacta na crença quanto ao ano de fundação, mas desmascara as mentiras publicadas por James Anderson em sua Constituição, que davam conta da fundação em 1717 e de Antony Sayer como primeiro Grão-Mestre, e em sequência George Payne e John Desaguliers. Esses três, Sayer, Payne e Desaguliers, pelo que parece e até onde se pode comprovar documentalmente, nunca foram Grão-Mestres.
Não sei se fico feliz ou não ao dizer: “Eu avisei…”. De qualquer forma, com uma prova documental dessas, fica a dúvida se a Grande Loja Unida da Inglaterra (que, na verdade, somente foi fundada em 1813), manterá a comemoração dos 300 anos para o ano que vem, mesmo que imprecisa, ou a adiará por mais alguns anos…
por Kennyo Ismail | set 1, 2014 | História
A pesquisadora Jessica Harland-Jacobs (2007) relata que, enquanto em muitos países a Maçonaria se mostrou uma instituição cosmopolita e inclusiva, a Grande Loja Unida da Inglaterra optou por seguir um caminho diverso, tornando-se essencialmente imperialista, branca, protestante e de classe média/média-alta. Em suas próprias palavras, os maçons ingleses “tiveram que negociar uma disjunção entre sua ideologia universalista… e suas funções e pressupostos como imperialistas”.
Jessica teve razões para chegar a essa conclusão. No artigo de Andrew Prescott (2007), por exemplo, vê-se que, logo após a fusão das duas Grandes Lojas inglesas, surgindo então a Grande Loja Unida da Inglaterra, iniciou-se um movimento, capitaneado por Robert Crucefix, para restringir na Inglaterra o ingresso à Maçonaria apenas para cristãos – não católicos, obviamente – além da promoção de um elitismo, taxando maçons escoceses e irlandeses como “mendigos maçônicos”. Prescott ainda registra fatos relacionados às primeiras Lojas Maçônicas inglesas em colônias como a Índia, e o preconceito que reinava nessas Lojas acerca dos nativos das colônias, suas religiões e classe social. Um dos fortes indícios apontados por Prescott para confirmar a tendência religiosa da Maçonaria inglesa são as melodias de origem cristã dos hinos adotados no Ritual de Emulação e em vários outros rituais ingleses.
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por Kennyo Ismail | fev 14, 2012 | Conceitos
Para muitos maçons mal informados, a Grande Loja Unida da Inglaterra exerce função de “xerife” do mundo maçônico, sendo a legítima guardiã da regularidade maçônica, devendo ditar as regras a serem seguidas pelas demais Obediências. Para esses, se a Maçonaria fosse uma religião, a GLUI seria uma espécie de Vaticano Maçônico. É importante esclarecer que a GLUI não tem essa autoridade e que isso é totalmente contrário a todos os princípios maçônicos de autonomia, soberania e igualdade entre Obediências.
A quase submissão das Grandes Lojas da Escócia, Irlanda, Índia e de algumas Grandes Lojas da Austrália e Canadá é até tolerável, considerando terem esses países pertencido ao Império Britânico e a GLUI ter sido a provedora de tais Grandes Lojas. Porém, a submissão presenciada por outras Obediências no restante do mundo, e até mesmo no Brasil, é inaceitável e demonstra que o “complexo de vira-lata” alcança até as fileiras maçônicas.
Para quem não está familiarizado com o termo, o complexo de vira-lata é uma expressão de autoria de Nelson Rodrigues para se referir à inferioridade e submissão que muitas vezes o brasileiro se impõe voluntariamente. E, infelizmente, essa postura foi historicamente institucionalizada na Maçonaria brasileira em relação à Inglaterra.
O desavisado que visitar a Maçonaria Regular nos chamados países desenvolvidos descobrirá que essa idolatria à GLUI não é compartilhada pelos mesmos. Muito pelo contrário: verdade é que a GLUI não faz parte da vanguarda maçônica, seguindo várias vezes a tendência impulsionada por outras Grandes Lojas, quase que pressionada pelas mesmas a sair da inércia.
Antes de elevar a GLUI ao posto de “rainha do mundo maçônico”, posto esse que os britânicos já estão familiarizados pelo modelo de Estado, reflita um pouco sobre isso: A Maçonaria está diretamente ligada ao princípio de Liberdade, considerado direito natural dos homens. E enquanto o mundo ocidental ainda experimentava o gosto amargo das monarquias absolutistas, a Maçonaria já sentia o doce sabor da democracia em suas Lojas e Grandes Lojas. Sendo precursora dos ideais libertários e democráticos, a Maçonaria participou ativamente e de forma determinante da Revolução Francesa e da libertação de praticamente todos os países do continente americano. Atualmente, até mesmo em países como Cuba, que vive uma Ditadura Castrista há mais de 50 anos, a Maçonaria mantém intacta a chama da democracia em seu interior, elegendo periodicamente seu Grão-Mestre. No entanto, eu pergunto: Qual é a única Grande Loja do mundo que traiu esse princípio de democracia, tirando do povo maçônico o direito sagrado de escolher entre os seus membros um Grão-Mestre? A Grande Loja Unida da Inglaterra.
O Príncipe Eduardo, Duque de Kent, é Grão-Mestre da GLUI desde 1967, ou seja, uma “ditadura maçônica” que dura 45 anos. Alguns podem questionar essa afirmação, dizendo que ele é constantemente “reeleito”. Porém, não devemos nos esquecer que Fidel Castro também era. Ambos, por motivos óbvios, sempre foram candidatos únicos.
Se a Maçonaria Regular Mundial acha por bem tolerar tal situação proveniente da GLUI, entendendo que é uma questão de cultura dos maçons ingleses que, assim como os cidadãos daquele país, ainda se sujeitam em dividir os homens (e os maçons) entre nobres e plebeus, e favorecer esse primeiro grupo em detrimento do segundo, isso é fraternalmente compreensível. Afinal de contas, a tolerância é um dos belos ensinamentos transmitidos pela Maçonaria. Mas que fique claro ao maçom que lê estas palavras: a Grande Loja Unida da Inglaterra não é um modelo a ser seguido, quanto mais uma autoridade a ser obedecida.