por Kennyo Ismail | jul 26, 2024 | Notícias
Quem acompanha este blog há mais tempo sabe que faz dez anos que chamo a atenção para a questão da inclusão de PCD na Maçonaria brasileira. Então, podem imaginar minha alegria a cada passo que damos nessa direção.
(Mas se você é daqueles que não sabem nem do que se trata, recomendo que, antes, leia este post antigo aqui do blog: https://www.noesquadro.com.br/conceitos/deficientes-fisicos-na-maconaria-brasileira-um-antigo-tabu/)
O fato é que, nesses dez anos, apesar de alguns autores também terem escrito a respeito e termos notícias de casos isolados em que candidatos com alguma deficiência física leve foram aceitos; ainda acompanhamos espantados manifestações medievais de irmãos condenando a indicação de candidatos cegos, cadeirantes, etc.
Como sabemos, as potências regulares brasileiras não têm explícito em suas constituições qualquer tipo de veto ao ingresso de PCD na Maçonaria. Contudo, todas têm, em suas legislações, a menção à observância dos “antigos Landmarks”. E, historicamente, esses Landmarks referem-se aos 25 Landmarks de Mackey, cujo 18º preconiza que os candidatos devem ser isentos de defeitos físicos e um aleijado não pode ingressar na Fraternidade.
Assim, a cultura maçônica brasileira, que difunde a falsa ideia de que esses Landmarks são universais e imutáveis, leva à discriminação por muitos irmãos, que utilizam do anonimato proporcionado pelo modelo de escrutínio secreto para garantir o veto a possíveis candidatos PCD.
O primeiro passo para quebrar esse paradigma foi do Grande Oriente do Brasil – GOB. Em 06/12/2019, o Conselho Federal do GOB deliberou favoravelmente à aceitação de candidatos com deficiência, o que, de certa forma, sinalizaria ao povo gobiano que tivesse contato com tal decisão de que a deficiência não poderia ser vista como um empecilho.
Já em julho de 2023, em Porto Velho, durante a 52ª Assembleia Geral Ordinária da CMSB – Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil, a Grande Loja do Pará (se não me engano) propôs a temática da Maçonaria Inclusiva, a qual foi aprovada. Como resultado, a CMSB promoveu seu IV Concurso Literário com esse tema e, à luz dos estudos feitos a respeito, a questão foi mais profundamente discutida na 53ª Assembleia Geral da CMSB, em julho de 2024, em Recife.
Dali, surgiu uma Interpretação do 18º Landmark de Mackey, aprovada por unanimidade no Seminário de Relações Exteriores dessa Assembleia, que poderá melhor instruir o povo maçônico das Grandes Lojas sobre a questão:
“É importante reconhecer que o contexto social e as normas mudaram significativamente desde a época em que o XVIII Landmark foi escrito. Naquela época, pessoas com deficiências físicas eram frequentemente excluídas da sociedade e, consequentemente, da Maçonaria, com base em preconceitos e estigmas. Hoje, vivemos em uma sociedade mais inclusiva, onde as pessoas com deficiência têm plenas condições de exercer sua cidadania, seja trabalhando, gerando seu sustento e participando ativamente em diferentes esferas da vida. Portanto, entende-se ser fundamental a reinterpretação do termo “aleijado” à luz dessas mudanças, ou seja, sob uma ótica social e não sob o aspecto físico.”
Desse modo, fica claro que não se está abolindo ou modificando qualquer Landmark, mas apenas oferecendo uma interpretação atual, considerando a intenção do legislador, Albert Mackey, no século XIX. Apenas deficiências que impeçam um candidato de se fazer presente às atividades maçônicas, bem como de arcar com as despesas da Ordem sem prejudicar seu sustento, devem ser consideradas.
Agora, o desafio é difundir esse entendimento, conforme a sabedoria de cada gestor maçônico.
por Kennyo Ismail | maio 31, 2024 | Crítica literária
Como algumas potências têm mudança de gestão de suas lojas programada para junho, a editora No Esquadro acaba de publicar uma nova edição da obra O LIVRO DO VENERÁVEL MESTRE.
A obra em por objetivo ajudar a desenvolver e aprimorar as habilidades e competências necessárias para administrar uma loja ou corpo maçônico, independente de rito, com uma série de dicas e ferramentas úteis à gestão maçônica, assim como um poderoso instrumento de autodesenvolvimento de liderança. Desenvolvido em uma linguagem leve e de fácil assimilação, “O Livro do Venerável Mestre” é leitura obrigatória para aqueles que assumem ou planejam um dia assumir a direção de uma loja ou organização maçônica e se preocupam em realizar um trabalho bem feito para se despedirem de irmãos “contentes e satisfeitos”.
Os irmãos interessados podem adquirir o livro pelo link: https://www.noesquadro.com.br/loja/
por Kennyo Ismail | maio 20, 2024 | Conceitos
Mulheres na Maçonaria não são um tema novo. Há registros históricos de mulheres como maçons operativas, bem como menções a estas no Poema Regius[1] (Séc. XIV) e no Manuscrito de York N.4[2] (Séc. XVII). Assim, somente a partir da Constituição de Anderson (1723),[3] o veto a mulheres passa a existir, mas não em absoluto.
Ainda no Séc. XVIII, surgiu o Rito de Adoção e as Lojas de Adoção, específicas para mulheres, a partir do Grande Oriente de França. E entre os Séculos XVIII e XIX, tem-se casos de mulheres iniciadas em lojas convencionais, como Elizabeth Aldworth, iniciada na Irlanda; Helene Hadik-Barkóczy, na Hungria; Marie-Henriette Heiniken e Maria Deraismes, na França; Julia Apraxin, na Espanha; Salome Anderson, na Califórnia; Catherine Babington, na Carolina do Norte, dentre outras.[4]
Entre o final do Séc. XIX e início do XX, começam a surgir as potências maçônicas mistas (com homens e mulheres), a partir da Ordem Internacional “Le Droit Humain” (1893); e as femininas, como a atualmente chamada “Ordem das Mulheres Maçons” (1908), que, apesar de ter sido criada mista, logo restringiu-se a mulheres.
No Brasil, o GOB fundou quatro lojas femininas, entre 1901 e 1902, que não emplacaram. E, em 1963, o então Grão-Mestre Geral, Álvaro Palmeira, tentou instalar o Rito de Adoção no âmbito do GOB, tendo sido vetado pela Soberana Assembleia Federal Legislativa daquela potência.[5]
Já no final do Séc. XX, a Grande Loja Unida da Inglaterra – GLUI e outras passaram a reconhecer a regularidade de prática da Maçonaria Feminina, permitindo que estas lojas utilizem seus templos, rituais e paramentos. Em seu site, a GLUI, declara ter “uma excelente relação de trabalho”[6] com a Maçonaria Feminina.
Hoje, a Maçonaria Feminina trabalha em estreita relação (sem intervisitação) com a Masculina em diversos países e não há forma de ser contra isso sem que seja por preconceito. Isso por uma simples regra: se você é contra algo que não prejudica você nem ninguém, isso é preconceito. E enquanto a Maçonaria Mista oferece algum tipo de prejuízo à convencional, pelo caráter concorrencial, apoiar a Maçonaria Feminina somente oferece benefícios. Dentre eles, pode-se citar: atendimento a uma demanda social, proteção contra possíveis processos futuros por discriminação de gênero, mais renda às lojas proprietárias de templos maçônicos com dias ociosos, e a certeza de que nunca se sentará em loja com sua sogra.
[1] BLUMENTHAL, M. (Org.) Antigos textos maçônicos e rosacruzes. São Paulo: Isis, 2006.
[2] HUGHAN, W. J. The Old Charges of British Freemasons. London: Simpkin, Marshall&Co, 1872.
[3] ANDERSON, J. A Constituição de Anderson. Trad. Kennyo Ismail. Brasília: No Esquadro, 2023.
[4] COIL, H. W.; BROWN, W. M. Coil’s Masonic Encyclopedia. New York: Macoy, 1961, p. 15.
[5] ISMAIL, K. Maçonaria brasileira: a história ocultada. Vol. I. Brasília: No Esquadro, 2021.
[6] Disponível em: https://www.ugle.org.uk/become-freemason/women-freemasons
por Kennyo Ismail | maio 7, 2024 | Conceitos
Um breve ensaio sobre a Maçonaria brasileira daqui a 10 anos.
Para ler o ensaio, CLIQUE AQUI.
por Kennyo Ismail | abr 18, 2024 | Conceitos
Há cinco anos, experimentamos no meio maçônico brasileiro algo que vem sendo chamado de União da Maçonaria Regular brasileira. Nesse período, os conflitos entre potências simbólicas, daqueles que geravam rompimento de relações, proibição de visitação e similares, foi inibido ao máximo, com raras exceções.
Mas na Maçonaria brasileira, de tédio não morremos. Às vezes, tem-se ruídos envolvendo potência simbólica e ordens como DeMolay, Filhas de Jó, Garotas do Arco-Íris ou Estrela do Oriente. Vez ou outra, há problemas de potência simbólica com as chamadas “oficinas-chefe” de ritos. E ainda, esporadicamente, há desgastes entre uma potência e a confederação ou federação da qual faz parte. É certo, como 1+1=2, que em seu Estado já teve, tem ou terá um desses problemas.
Assim, fica claro que a união, de fato, da Maçonaria regular brasileira é igual pipoca no cinema: todo mundo quer, mas não é prioridade pra ninguém. Além disso, está mais do que comprovado que essa união surgiu em nível nacional, não de uma amizade fraterna e crescente entre as lideranças, mas de uma necessidade emergencial, que foi a separação entre GOSP e GOB. O fim da perseguição aos Grandes Orientes da COMAB, perpetrado entre 2014 e 2018, e a nova cláusula dos tratados firmados pelo GOB a partir de então, confirmam isso.
O problema é a visão de que o conflito GOB x GOSP é um problema dos outros, restrito apenas à Maçonaria Paulista. É como estar sentado numa ponta do barco vendo a outra ponta afundar e pensar que não tem nada com isso. Esse é um problema de toda a Maçonaria regular brasileira.
Por que? Simplesmente porque a Maçonaria é baseada em princípios, sendo que um dos principais é o direito à visitação. Sem poder usufruir desse direito, poucos são os maçons e lojas que suportam. Não por acaso, tem-se um histórico de que grande parcela de lojas e irmãos que aderem a uma cisão, retornam nos dois primeiros anos. O medo do isolamento sempre foi a âncora que freou muitas cisões ou trouxe muitos dissidentes de volta.
E isso também ocorreu com o GOSP: muitos irmãos e lojas retornaram ao seio do GOB, ou foram para a GLESP ou para o GOP. E entre os que ficaram, escuta-se reclamações da falta de fraternidade de lojas dessas outras potências, ao fecharem suas portas para eles. Até já se esqueceram de que, entre 2014 e 2018, enquanto ainda eram parte do GOB, algumas de suas lojas fechavam as portas aos irmãos do GOP. O mundo maçônico também dá voltas… É a lei da ação e reação: as lojas do GOSP que naquele período não se submeteram ao veto, que visitavam e recebiam visitas das lojas do GOP, provavelmente sofrem menos hoje do que aquelas que vestiram o perigoso avental da superioridade.
O negócio é que o GOSP é grande e, mesmo com as perdas, continuou consideravelmente grande. Não se pode ignorar o fato de que São Paulo é o maior estado brasileiro em população, além de principal centro financeiro e corporativo do país. É difícil encontrar alguém que nunca foi a São Paulo, que não tenha um amigo ou parente lá, ou que não tenha que ir a São Paulo a trabalho.
Por isso, para as potências que surgem de novas cisões, a existência de um GOSP dissonante da Maçonaria Regular Brasileira rompe a corrente dessa âncora, derrubando a barreira de isolamento. Os descontentes de uma potência num estado qualquer, que pensariam três vezes antes de fazer uma cisão, por medo de ficarem isolados, já não têm mais esse medo. E essas “melhores condições” para dissidências têm apresentado seus primeiros resultados.
Enquanto GOB-SP, GLESP e GOP se uniram e se blindaram, fechando suas portas ao GOSP… o GOSP abriu uma janela. E essa janela é para fora de SP, onde se tem, em algumas localidades, uma frágil união e um terreno fértil para cisões, com um GOSP esperando para reconhecê-las. E assim, os não-reconhecidos passam a se reconhecerem, reduzindo aquela sensação de ostracismo em seus membros.
Sendo um efeito já experimentado em alguns estados, e que pode alcançar outros, deveríamos priorizar, pelo menos temporariamente, uma dieta da pipoca: os grandes players poderiam começar a pensar na possibilidade de conversar sobre o assunto.
Acha exagero? Nem na época em que não havia “união”, havia tanta cisão! Isso porque, quando as três vertentes não se davam tão bem, os dissidentes de uma simplesmente migravam para outra. Agora, com a “união”, portas foram fechadas, e criar uma nova potência, alinhada ao GOSP e o novo bloco que se forma a partir dele, parece algo mais fácil e menos traumático.
Então, a união leva à cisão??? A verdadeira união, não… mas quando criada pela razão errada, pode causar. Uma ponte construída, não para aproximar as partes, mas para que uma parte more embaixo dela, não é um meio de união, mas de divisão.
E é chato dizer, mas isso merece mais atenção do Brasil do que o Paraguai.