Com certeza você já ouviu falar que “homens fortes criam tempos fáceis e esses tempos fáceis geram homens fracos; então os homens fracos criam tempos difíceis; e esses tempos difíceis geram homens fortes”. Essa crença popular coaduna com o entendimento de que alguns fatos históricos se repetem, tendo o tempo um comportamento de espiral, com alternações de polarização, ou seja, um ciclo, tão virtuoso quanto vicioso.

Na política isso é identificado com a alternância de governos de espectro progressista e conservador. O Brasil é um bom exemplo claro disso. Após um período conservador (Monarquia), veio um período de décadas de relativo progressismo (Primeira República). Então surge outro período conservador (Era Vargas), seguindo do retorno ao progressismo (República Populista). Daí, mais uma vez, o conservadorismo retorna (Ditadura Militar) até a volta dos progressistas ao poder. E agora, iniciou-se mais uma onda conservadora, em 2019.

Esse fenômeno não está restrito ao Brasil. É mundial. Como exemplo, tomemos a América do Sul. Na década de 70, enquanto havia Ditadura Militar no Brasil, o mesmo ocorria na Argentina, na Bolívia, no Chile e no Uruguai. Outros dados, mais recentes, são de que em 2011, Brasil, Paraguai, Argentina e Peru tinham governos progressistas; enquanto que em 2018 os mesmos países passaram a ter governos conservadores.

E quanto a Maçonaria? Seus postulados não deixam dúvidas ao declarar a Maçonaria como progressista, o que sobrevive em muitas das constituições das potências maçônicas e em suas apresentações em websites oficiais. Ela sempre atuou nesse sentido, seja no exterior como no Brasil, onde defendeu a independência, lutou pela abolição da escravatura e envolveu-se com a criação da República. Não por acaso, nossa bandeira ostenta a expressão “Ordem e Progresso”, de origem positivista, que fazia parte do vasto campo progressista.

Outra inegável evidência da essência progressista da Maçonaria é que ela foi perseguida nos períodos de conservadorismo mais radical. No Brasil, fechada duas vezes na Monarquia (1818 e 1822), voltou a ser fechada no Estado Novo da Era Vargas (1937). Nesse período da década de 30, com a onda conservadora que assolou meio mundo, foi fechada por Franco, na Espanha; por Mussolini, na Itália; por Salazar, em Portugal; e por Hitler, na Alemanha, que perseguiria maçons em outros países, durante a II Guerra Mundial.

Que sejamos claros: Progressismo é a favor de grandes inovações, transformações e reformas. Princípios como Igualdade de todos perante a lei, garantia de Liberdades fundamentais, Democracia, Equidade, Justiça Social e Laicismo são conquistas progressistas dos séculos XIX e XX. O Conservadorismo é contrário a essas mudanças, defendendo a retomada de um modelo político-social anterior ao gerado pós-Iluminismo, que propôs ao homem a emancipação da tutela da Igreja e do Estado autoritário por meio da razão, e ocasionou na separação Igreja-Estado e no surgimento do Ensino Laico e da Liberdade Religiosa, dentre outras benesses.

A grande mensagem do Iluminismo sobre política era de que o povo não precisa de um messias, um salvador da pátria, um herói, para dizer-lhes o que é certo e governa-los. O Chefe de Estado deve ser enxergado como um servidor público, ou seja, que está ali para servir o povo. Por essa razão, não precisa ser amado e defendido como se fosse seu melhor amigo ou um membro de sua família, pois qualquer coisa boa que ele faça não é mais do que sua obrigação em servir. Por outro lado, ele deve ser sempre fiscalizado e cobrado. Quer ser idolatrado? Vire artista pop ou jogador de futebol. Política é serviço público. Mas o Brasil não teve um movimento iluminista de fato e boa parte da população ainda não aprendeu essa lição.   

A Maçonaria sempre defendeu a total separação entre Igreja e Estado (Religião e Política), o Ensino Laico, as Liberdades e a Igualdade. Desde suas primeiras publicações, na primeira metade do século XVIII, a Maçonaria considera que você ter uma religião diferente ou mesmo não crer em Deus não pode ser um crime ou impedi-lo de receber uma educação formal. Não podemos nos esquecer da chamada “Questão Religiosa” no Brasil, conflito entre Igreja Católica e Maçonaria na década de 70 do século XIX, exatamente pela Maçonaria defender essas bandeiras progressistas contra o conservadorismo dos sacerdotes ultramontanistas da época. Lembremos também que muitas das primeiras escolas laicas do Brasil foram de iniciativa maçônica.

O lema “Deus, Pátria, Família”, tão repetido na atual onda conservadora brasileira, era o lema dos Integralistas, grupo fascista que surgiu na década de 30 e foi bastante atuante no período mais conservador da Era Vargas. Esse grupo, liderado intelectualmente pelo antimaçom e antissemita Gustavo Barroso (uma espécie de Olavo de Carvalho com diplomas), era contra a Maçonaria. Barroso chegou a escrever livros atacando a Maçonaria, como “História Secreta do Brasil” e “Judaísmo, Maçonaria e Comunismo”.   

O retorno do Conservadorismo ocasiona nisso, na proliferação de ideias integralistas, fascistas e nazistas. E essa proliferação começa a ficar evidente com a defesa de um terreno favorável ao nazismo em um famoso podcast, apoiada por uma discreta saudação nazista em outro programa. Há pesquisas que indicam que os grupos neonazistas cresceram quase 300% no Brasil nos últimos três anos e especialistas temem que o uso da violência seja alavancado por esses grupos.

E qual é a próxima vítima? Provavelmente a Maçonaria. É o que já está acontecendo nos EUA e em outros países. Em março do ano passado, um edifício maçônico foi incendiado por um conservador, em Vancouver, Canadá. Em janeiro deste ano, a sede da Grande Loja da Irlanda sofreu um incêndio criminoso. O mesmo ocorreu em um prédio maçônico de Ohio no início deste mês, seguido de uma publicação antimaçônica em redes sociais que sugeria novos incêndios, feitas por um famoso pastor evangélico norte-americano. Somente nesta semana, a porta de vidro da fachada da Grande Loja de Illinois foi apedrejada duas vezes. E lojas daquela jurisdição têm relatado outros casos de vandalismo.

Você acha que isso é muito distante da realidade brasileira? Não víamos inflação há trinta anos e olha ela de volta… Só é necessário que um conservador desorientado atire a primeira pedra, para experimentarmos esse pesadelo no Brasil. Caso isso aconteça, esperamos que nossas lideranças tenham postura diferente dos líderes maçônicos brasileiros no Estado Novo, que optaram àquela época por trair os irmãos e os princípios maçônicos, prostituindo a Maçonaria em troca de migalhas.

Por fim, quanto a você ser conservador e ser maçom, não há problema algum nisso. Assim como há pardo nazista, preto de alma branca, prostituta apaixonada e pobre contra o SUS, todos encontram de alguma forma uma lógica em seus raciocínios, de modo a não sofrerem uma dissonância cognitiva. Conservadores sempre foram e ainda são bem vindos na Maçonaria que, enquanto progressista, é tolerante (ao contrário do conservadorismo).